quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Catatau e Guizado, breve crônica de um encontro

Nada de ensaio, nem mesmo um telefonema para alguma combinação prévia. Fernando Catatau e Guilherme Mendonça a.k.a Guizado chegaram sem nenhum número preparado para o encontro proposto pelo Pelas Tabelas em uma tarde quente de abril no Zé Presidente. As três músicas resultantes do encontro, vistas parcialmente na edição do programa, nasceram do improviso. Aqui, recordo parte das cenas que presenciamos, ainda que sons e imagens falem por si.

Além da guitarra e da pedaleira, Catatau levou uma bateria eletrônica para fazer a base rítmica. A partir da escolha de uma batida reta em loop constante, sem quebras de andamento, Catatau improvisava uma base harmônica na guitarra, dando margem aos contornos melódicos propostos pelo trompete de Guizado. Aí, então, "sustos" de parte a parte, como definiu o trompetista, iam determinando os rumos das composições instantâneas.

A primeira, que na edição serviu para o encerramento do programa, saiu lenta, arrastada, quase fúnebre. Com notas dispersas por uma mão direita hesitante, a guitarra de Catatau a empurrava para viagens psicodélico-progressivas, enquanto o trompete trafegava pelas dissonâncias do jazz. Um tema próprio a desencontros.

Para o segundo número, Guizado pediu um batida mais acelerada. Escolhido um beat que remetia à música caribenha, imediatamente Catatau improvisou um riff que estruturou a primeira parte. Enquanto Guizado decifrava a sequência harmônica, o guitarrista criou uma segunda parte. Antes de começar a tocar pra valer, perguntou se Guizado poderia acompanhá-lo naquela variação. Permissão concedida, o resultado foi esse:



A música que abre o programa foi a terceira e última da sessão - um blues-rock com riff desenhado em uma sequência de acordes maiores. Reprocessado por pedais de efeito, o trompete soa como guitarra solo. É a música em que os dois estão mais soltos e arriscam maiores desvios do curso estabelecido no começo.

No fim, ouvindo as três músicas, nota-se que nenhuma delas remete diretamente ao som que Catatau e Guizado fazem quando acompanhados por suas respectivas bandas, que aliás, têm dois integrantes em comum - o guitarrista Régis Damasceno e o baixista Rian Batista. Catatau tem se apresentado com uma formação instrumental em um projeto paralelo ao Cidadão Instigado, então, não será estranho que Guizado junte-se a ele qualquer hora dessas para uma participação. Porém, a combinação de guitarra, trompete e beats eletrônicos dificilmente se repetirá.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Moraes X Jornalista - Novos Baianos ainda causam polêmica

Havia desistido da Trip por total falta de interesse em suas pautas, mas comprei a edição atualmente nas bancas por causa da capa com os Novos Baianos. Ao folhear a matéria, de cara me senti enganado. Uma reunião da banda sem a participação de Moraes Moreira e Pepeu Gomes pode ter lá seu valor histórico, mas o uso do nome Novos Baianos para divulgá-la constitui uma fraude. De antemão eu sabia que a assinatura de Pedro Alexandre Sanches era a garantia de que algum veneno seria destilado naquelas páginas e me pus a lê-las. Ao final da leitura, confirmei minha expectativa: texto descartável e irrelevante. Mas eis que a reportagem ganhou inesperada sobrevida na internet devido a uma carta-resposta assinada pelo próprio Moraes.

Você pode acompanhar a polêmica aqui. Motivado pelo conjunto da obra, com direito a tréplica do injustiçado jornalista, fiz o seguinte comentário na seção destinada a opinião dos leitores:

A reportagem em si nada traz de novidade, até porque os Novos Baianos há muito tempo não têm nada de novo pra contar. Quem quiser conhecer a fundo esta história que recorra diretamente à fonte através do livro Anos 70: Novos e Baianos, escrito por Galvão e publicado pela Ed. 34, hoje disponível apenas nos melhores sebos do Brasil. O único mérito do texto foi ter suscitado este revelador debate entre o artista (Moraes) e os seus algozes da mídia (no caso, Pedro Alexandre).

Para se ter uma ideia, o vídeo da TV Trip se presta perfeitamente ao papel de equivalente audiovisual da reportagem: você já viu e leu isso antes muitas e muitas vezes - porém em versões bem melhores.



De um lado, o velho baiano deu um longo depoimento muito mais revelador do que teriam sido uma ou duas aspas soltas no corpo da matéria, caso ele tivesse comparecido ao encontro, sobre o estado atual das relações entre os antigos companheiros. Do outro, escancara a mediocridade - salvo raras exceções - do jornalismo cultural brasileiro baseado em um certo padrão sempre em voga lá pelos lados da Alameda Barão de Limeira, sede da Folha de São Paulo. A saber, o de criar polêmicas artificiais de baixo valor cultural e/ou informativo tratando-as como se fossem furos de reportagem.

Não é de se estranhar, afinal, PAS deve muito - se não todo - do seu prestígio à referida empresa (a qual hoje critica por entender que as denúncias de corrupção no seio do governo federal da cobertura política da campanha presidencial baseiam-se em factóides contra a sua virtualmente eleita candidata, expediente que ele volta e meia usa, como no caso em questão, para apimentar os textos que assina). Certamente não foram seus dois livros sobre as obras de Roberto Carlos (Como Dois e Dois são Cinco), Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque, Paulinho da Viola e Jorge Ben (Tropicalismo: A decadência bonita do samba) que lhe conferem o status que hoje goza para dizer-se "free-lancer", ou seja, em tradução livre na cartilha do "óbvio-lulante", liberto dos grilhões dos grandes conglomerados de mídia. Ambas as obras não passam de análises pré-concebidas das carreiras dos respectivos compositores a partir de interpretações superficiais e arbitrárias das letras de suas canções.

É engraçado que este padrão Folha de jornalismo, que PAS hoje tanto critica, me pareça bastante similar àquele que ele costumava praticar quando era titular da Ilustrada e não perdia oportunidade para se envolver em polêmicas com o então "ultrapassado" e "careta" Caetano Veloso. (Quem sabe, PAS não tenha algum mérito na guinada elétrica deste outro compositor baiano com quem adorava se indispor?)

Fazer-se de vítima das circunstâncias para assumir-se como personagem de textos jornalísticos de outro modo desprovidos de valor é a sua especialidade. E não é de hoje, não. É assim desde os tempos bicudos (e tucanos) do governo FHC. Porém, ao contrário de seus grandes ídolos da esquerda brasileira, sua notoriedade passa ao largo das grandes massas. Restringe-se aos diretores de redação e aos donos de jornais e revistas, o que, no restrito universo do jornalismo brasileiro, não chega a ser nada mal.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Cd do Sonantes sairá no Brasil via Oi Música

É estranho pensar que em tempos de mp3 o lançamento físico de um disco no mercado ainda seja um fato importante. Vejamos, pois, o caso do Sonantes, projeto coletivo idealizado por Céu, Pupillo, Dengue, e os irmãos Rica e Gui Amabis, que contou com participações de nomes não menos eminentes, tais como Fernando Catatau, Lucio Maia, Siba e Beto Villares.

O laboratório de criação da turma se ativou após a reunião para gravação de duas faixas, "Doce Guia", para o disco Na Confraria das Sedutoras, do 3naMassa, e "Frevo da Saudade", para a coletânea Frevo do Mundo. Sem um compromisso definido a não ser o de fazer um som, eles acabaram concebendo um disco inteiro, lançado em 2008 somente no exterior, pela Six Degrees Records. E aquele que certamente foi um dos melhores discos produzidos no Brasil naquela ocasião acabou passando quase em branco por aqui. Falou-se nele apenas aqui e acolá. A bem da verdade, o G1 e a Rolling Stone Brasil chegaram a noticiá-lo antes do lançamento. Depois, nada. Inclusive, não figurou na lista de melhores daquele ano eleitos pela revista. Ausência que chegou a ser comentada na sessão destinada às opiniões dos leitores.

E por quê? Arrisco uma opinião, ainda que sem qualquer base empírica. O disco não foi lançado fisicamente e por conseqüência não chegou às redações, às mãos dos ditos formadores de opinião. Talvez tenha sido tema de uma ou outra reunião de pauta, mas acabou na gaveta por questões de "mercado", fundamentalmente a falta de uma assessoria de imprensa para divulgar a obra e cavar espaços na mídia.

Conclusão: no Brasil o suporte físico ainda é fundamental e o vácuo mercadológico de um não-lançamento oficial - ainda que as faixas estejam desde então circulando livremente no território da pirataria autorizada - é uma razão forte para tanto.

É de se ressaltar também que o cd não fora lançado aqui à mesma época que saiu lá fora porque os músicos envolvidos não conseguiram um contrato que os satisfizesse. Ponto para o selo Oi Música, que vai desengavetar o disco para lançá-lo em terras brasileiras. Dois (ou três) anos depois, poderá ser descoberto pela mídia oficial com sabor de novidade. Só a faixa de abertura, com Céu no vocal à frente dos integrantes da Nação em uma versão de "Carimbó", gravada originalmente pela banda pernambucana em Rádio S.A.M.B.A, já faz dele um clássico.


Lamenta-se apenas que a iniciativa não sirva de ensejo para uma reunião dos músicos envolvidos no intuito de levar o disco aos palcos. Por enquanto não há planos nesse sentido. Quem sabe depois de uma turnê pelo exterior?