quarta-feira, 5 de novembro de 2008

A Mula é Manca e Fabulosa

Em 2007, a Mula Manca lançou logo em janeiro um dos melhores discos do ano. A Triste Figura de O Circo da Solidão (2004) virara Fabulosa em Amor e Pastel. Os arranjos outrora crus, com produção canhestra em formato rock, com baixo, bateria, guitarra e teclados, trocaram as cordas elétricas pela proeminência acústica do violão. Castor Luiz assumiu os teclados, alguns vocais e assinou a composição de algumas faixas. As referências se tornaram mais óbvias. Samba, jovem guarda, a música da geração nordestina dos anos 70 - de Fagner, Belchior e Ednardo. Nada do que se esperaria de uma banda pernambucana pós-mangue beat. Canções com um apelo pop talhadas por uma produção mais limpa e homogênea. Cada faixa, um clássico com alto potencial radiofônico, fossem outros tempos.

Mas Amor e Pastel passou em branco, ou, no mínimo, não alcançou a repercussão que merecia. A ponto de a banda não ter vindo ao Rio para divulgar o disco. Não por falta de vontade. Em emails trocados com o produtor da banda logo depois do lançamento, ele contou estar negociando a vinda da Mula Manca ao sudeste. Não sei se chegaram a ir a São Paulo.

Felizmente, a disseminação de um projeto paralelo de seus integrantes associados ao pianista Vitor Araujo, o Seu Chico, em que reinterpretam canções de Chico Buarque com um sotaque pernambucano, despertou o interesse do público "sulista". Shows foram marcados e no mês passado, paralelamente às apresentações lotadas do Seu Chico no Teatro Odisséia, a banda fez duas apresentações no Cinemathèque Jam Club.

Pindzim compareceu à segunda. Havia pouca gente, todos contidos, apesar da performance expansiva e por vezes teatral de Tibério Azul. Não sei se a primeira foi diferente, mas se no mesmo Cinemathèque a primeira apresentação do Seu Chico fora uma festa, a derradeira apresentação da Mula Manca estava mais para a triste figura de O Circo da Solidão do que a da fabulosa de Amor e Pastel. Nem por isso a banda esmoreceu. No palco, mostraram que se trata de uma das boas bandas brasileiras da atualidade. Hoje, talvez, a mais interessante da terceira geração pernambucana pós-mangue, agora que o Mombojó perdeu seus dois músicos mais inventivos e se acomoda nos trilhos do rock convencional.

Aqui, "Pé no Chão", uma das músicas de Amor e Pastel, no show do dia 10 de outubro:



Comentário ouvido no show referenda o que Pindzim ouvira de amigos a respeito da banda: entre os admiradores cariocas do grupo há uma preferência pelo primeiro disco da banda, O Circo da Solidão. Concebido como uma ópera rock-poético-circense, a estréia da Mula Manca apresenta uma banda peculiar, com uma identidade própria bem definida. Referências literárias, especialmente a triste figura de Dom Quixote, a música brasileira difusa se insinua aqui e ali, e o universo do circo. O apelo pop latente em Amor e Pastel se oculta diante da simplicidade da produção, que mais se aproxima dos resultados de uma fita demo do que de um disco pronto e acabado. Há pinceladas de humor, muito mais evidentes em Amor e Pastel, mas a farra que se inicia na folia, com "Carnaval", vai mergulhando em uma melancolia desesperada e se encerra com a desesperada "Ainda Sou Louco o Bastante para Rir".

Faixa central, que foi pedida pelo público do Rio em evocação ao primeiro disco, "O Palhaço e a Bailarina" dá a medida entre um extremo e outro. Ele quer conquistá-la sorrindo, mas acaba tendo a maquiagem borrada pelas lágrimas de um amor impossível:



Mas é justamente esse estilo underground, para não dizer tosco - independente não compreende o sentido que O Circo da Solidão tem para esses admiradores - que o torna um disco especial, icônico. Há um sentimento de traição às origens da banda que sabota o evidente passo adiante que, de fato, representou Amor e Pastel. Parte desta frustração advem também das expectativas criadas pelo "segundo disco". Para isso, só há um remédio: o terceiro disco. Músicas novas foram mostradas no Rio. É de se esperar que em breve a triste figura venha a se reconciliar com a fabulosa. Afinal, entre a solidão e o amor a distância é tênue.

2 comentários:

Anônimo disse...

ta na hora do novo da mula.....
boa essa do Seu Chico....
pind tá sempre ligado...
abz

Anônimo disse...

pow queremos ver esse Seu Chico ae...
bom pacarai o txt