domingo, 1 de julho de 2007

Entrevista: Thais Gulin

A melhor maneira de conhecer o trabalho de um artista novo é assistindo à sua apresentação ao vivo. No palco, a integridade musical de uma intérprete revela-se sem subterfúgios. A voz ecoa sem filtros. A presença de palco e a capacidade de conquistar o público são postas a prova. O arranjo das canções desnudam as sutilezas da produção em estúdio. Assisti ao show de Thais Gulin em sua estréia no Centro Cultural Carioca antes de ouvir ao disco de estréia da cantora e fiquei com uma boa impressão. Melhor ainda foi assisti-la na intimidade do Cinematèque Jam Club, colada ao público que lotava o pequeno espaço. Trata-se de uma intérprete em evolução, porém com uma identidade definida a partir do elemento fundamental para o sucesso de uma cantora: a voz.

A curitibana radicada no Rio de Janeiro trafega pela via larga das cantoras que casam a tradição da MPB consagrada de autores como Chico Buarque, Toquinho e Zé Ramalho às atualidades de compositores contemporâneos, como Zeca Baleiro. Porém, sua música se destaca pela escolha de músicas nada óbvias do repertório de tais compositores e, principalmente, por sua predileção pela obra de artistas marginais, embora não menos importantes, como Tom Zé, Jards Macalé e Arrigo Barnabé. Representando a nova geração desta linhagem "maldita", comparecem o pernambucano Otto e as paulistas Iara Rennó e Anelis Assumpção, do grupo Dona Zica.

A experiência como atriz no passado, mesmo que inconscientemente, foi um elemento fundamental para a escolha do repertório e, conseqüentemente, para a construção de uma identidade particular. O elemento catalisador da musicalidade de Thais é a sua voz. A força de seu trabalho provém das emoções que o seu canto evoca na interpretação de músicas cujas letras, no conjunto, se caracterizam por conter uma alta carga dramática.

No momento, Thais se dedica à divulgação do disco de estréia lançado no ano passado pela gravadora independente Rob Digital. Nesta semana, ela faz show em Paraty, onde acontece a FLIP. Em entrevista ao Blog do Pindzim, a cantora fala sobre o seu espaço no cenário atual da música brasileira, a concepção do disco e os efeitos da internet sobre a produção musical.

Pindzim: A música brasileira vive um momento em que muitas cantoras têm se destacado com trabalhos que unem a tradição de compositores consagrados às novidades de jovens compositores. Seu trabalho de estréia desenvolve esta linha. Neste cenário, qual seriam as particularidades de sua música e com quais outros artistas contemporâneos você se identifica musicalmente?
Thais Gulin: Eu me identifico e adoro a Monica Salmaso, Bjork, Mart'nália, Caetano, Tom Zé, Rumo, etc... Tenho ouvido muitos discos de música experimental também. Quanto a essa mistura de tradição e novidade, quando terminamos o disco, acabei achando o repertório bem atemporal, principalmente as canções dos compositores mais tradicionais. Me sinto absolutamente exposta nesse repertório.

Pindzim: Destaca-se no seu trabalho o repertório nada óbvio, com compositores de épocas e tendências diversas, mas que mantém uma unidade estética. De que maneira você chegou às músicas que compõem o disco?
Thais Gulin: O processo todo durou quase 4 anos. No começo o objetivo nem era gravar um disco. Eu queria descobrir na música o que seria mais pessoal para mim. Começou com a demo que gravei com o Fernando Moura (produtor do disco). Fomos testando e descobrindo as sonoridades, a direção dos arranjos, a formação. Duas músicas do demo estão no disco: "Hino de Duran" (com outro arranjo) e "A Vida da Outra (Dela) ou Eu" (com o mesmo arranjo do demo). Depois dessa demo, comecei a fazer shows no Rio e o repertório foi se formando. Era um entra e sai de músicas... "Cedotardar", "Cinema Incompleto" e "Cisco" entraram só na época da pré-produção do disco. E "78 rotações" entrou quando o disco já estava quase todo gravado. Eu tinha pedido "Movimento dos Barcos" (também do Jards Macalé e do Capinam) a um amigo e ele mandou a música com esse título, mas a que estava lá era "78 rotações". Adorei o acaso, adorei a canção, fechava bem o conceito do disco. E ficou assim.

Pindzim: Você assina duas músicas do disco, "A Vida da Outra (dela) ou eu", parceria com Rogério Guimarães, e "Cinema Incompleto (Núpcias)", com Arrigo Barnabé. Como funcionou o processo de composição nestas duas músicas e qual a sua participação em cada uma delas, letra, melodia?
Thais Gulin: Letra. Na "Vida da Outra" fiz primeiro a letra, o Rogério fez a música e depois ainda acrescentamos juntos uma segunda estrofe. No "Cinema Incompleto" eu letrei a música já pronta do Arrigo.

Pindzim: Como tem sido o trabalho de divulgação do disco? Em quais cidades você já se apresentou e quais serão os próximos passos?
Thais Gulin: A divulgação do trabalho se deve quase totalmente à imprensa e às rádios. Quanto aos shows, o primeiro lançamento foi no Guairinha (Teatro Guaíra) em Curitiba, depois fizemos uma temporada, no Centro Cultural Carioca. Fizemos Cinematheque, Letras e Expressões, Modern Sound e outras casas, ainda no Rio. Esse mês, teve mais uma temporada no Centro Cultural Carioca. No final de semana passado foi o lançamento aqui em São Paulo, no Sesc Vila Mariana e ainda fizemos um pocket show na Livraria da Vila. Na semana que vem (quinta-feira), vamos nos apresentar na FLIP em Paraty (no Che Bar). Esse ano, ainda quero fazer o lançamento em Belo Horizonte, Porto Alegre, voltar a Curitiba e fazer uma temporada em São Paulo.

Pindzim: Nos shows, você tem recebido convidados como Nelson Sargento, Otto e Jards Macalé. Você já os conhecia ou conheceu-os em decorrência de ter gravado canções destes autores no disco?
Thais Gulin: O S. Nelson, eu conheci num show que fiz no Teatro do Planetário há uns 3 anos. Eu cantava "Homenagem ao Mestre Cartola" e o convidei para fazer uma participação nessa música. Mandei o demo para ele, ele gostou e topou fazer. Nesse show acabamos cantando também "De Boteco em Boteco" - foi quando essa música entrou no repertório. O Otto, tínhamos uma amiga em comum e nos conhecemos no aeroporto de Congonhas, há uns 2 anos. O Macalé, foi só depois do disco. Mandei a ele, ele curtiu e, mais tarde, veio a participação. É sempre uma surpresa cantar com os autores, porque você passa tanto tempo cantando aquela música, com uma certa visão, e de repente entra quem escreveu e desconstrói tudo. Abre uma outra perspectiva.

Pindzim: Para você, qual a importância da internet como meio de divulgação para o seu trabalho, através de mp3 e sites como myspace e youtube? Por vezes pode ser um instrumento sobre o qual o artista não tem controle, como quando um fã disponibiliza o disco em mp3 ou posta um vídeo sem prévia autorização. Você encara esses aspectos como negativos?
Thais Gulin: Não. Não dá para ignorar a presença da internet e querer que tudo seja como antes. Ela não existe para ter limite e é um espaço difícil (ou impossível) de ser regulamentado e controlado. O mercado ainda não se adaptou a isso e ninguém apareceu com uma resposta. Além de que muitos discos que estão na rede, não estão nas lojas. É ruim que baixem sua música de graça? Um disco onde foi investido tanto trabalho e tanta verba? Por esse lado, sim. Mas, não é bom que cada vez mais pessoas conheçam a sua música? Sim. Então, enquanto não houver uma solução com a qual todos fiquem felizes, vou sempre preferir que cada vez mais pessoas tenham acesso ao meu trabalho. De qualquer maneira, eu adoro um bom encarte de cd. Mais ainda, uma capa de disco de vinil. :-)

2 comentários:

Anônimo disse...

assisti ao show da Thaís no Cinematheque e Sesc Vila Mariana... e me encantei! É muito bom quando um artista nos emociona. Parabéns Gulin!

Anônimo disse...

assisti ao show da Thaís no Cinematheque e Sesc Vila Mariana... e me encantei! É muito bom quando um artista nos emociona. Parabéns Gulin!