quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Retrospectiva 2007: Shows - Parte 1

2007 se encerrou. É comum que se façam balanços retrospectivos sobre o que de melhor aconteceu em diversas áreas. Na música, normalmente, as listas de melhores discos predominam e Pindzim não vai se furtar a oferecer a sua àqueles que estiverem interessados. Porém, os momentos de maior prazer dos amantes da música são os shows. Assistir ao ídolo querido, descobrir uma banda ou um artista novo confrontando-o da platéia, conferir como a sonoridade de um disco é retrabalhada no palco. Enfim, a experiência única de ver a música sendo construída nota por nota em tempo real, sem mediação. 

Lembro abaixo alguns grandes momentos sem pretensões hierarquizantes. Afinal, na música, melhores e piores são determinados por uma questão intransferível de gosto pessoal:

Nação Zumbi - Circo Voador - 14 de dezembro
Fome de Tudo, o disco novo da Nação lançado no fim do ano, não me pegou de imediato. Não porque soasse mais ou menos pop, como se tem discutido. E sim porque é normal que os discos mais relevantes, aqueles que entram para a história, causem em um primeiro momento uma sensação de estranhamento. Com este sentimento aliado a uma certa preguiça devido a fúria que o som da Nação provoca sobre o público, me dirigi ao Circo Voador. Cheguei quando rolava o show de abertura com Ortinho e convidados. Naquele instante, cantava o mago Junio Barreto, "Amigos bons".  Mesmo sozinho, pareceu-me um bom presságio. Me posicionei no melhor ponto da pista do Circo e ali fiquei até o fim, sem sair para beber ou mesmo ir ao banheiro. Transpostas para o palco, misturadas às antigas, as músicas de Fome de Tudo se distinguiram dos velhos clássicos por valorizarem arranjos climáticos, os tambores trabalhados de forma mais sútil, pois a receptividade dos fãs a elas era automática. Apenas as reações mais contidas, entre o balanço e coros eventuais para a voz de Jorge du Peixe. Nas músicas mais antigas e pesadas a insana roda de pogo se espalhava por toda a pista. Confesso que os melhores momentos, para mim, foram os de Fome de Tudo e os poucos que relembraram o disco anterior, Futura. Otto se integrou a banda a partir do meio do show e não saiu mais, revezando-se entre a percussão e o vocal de apoio. Junio Barreto voltou ao palco para cantar "Toda Surdez Será Castigada". O ápice ficou para o fim. Foi quando B Negão subiu ao palco para cantar o refrão de "Manguetown", levada pela guitarra com um efeito espacial. É tudo que eu consigo lembrar daquele que foi o mais festivo show da Nação que assisti até hoje. 

Céu - Mistura Fina - 29 e 30 de novembro
Céu é uma cantora que recria suas músicas ao vivo com auxílio de sua excelente banda. Já escrevi sobre isso aqui. Ao longo destes dois anos de carreira nos palcos, as músicas foram ganhando novos detalhes. Improvisos vocais, as batidas quebradas do baterista Sérgio Machado alterando o ritmo aqui e ali, os scratches do DJ Marco preenchendo espaços com overdubs, injetando um suíngue derivado do hip-hop sem se impor sobre a multiplicidade sonora que caracteriza a musicalidade da cantora. Dependendo da noite, o show pode enveredar por improvisos jazzísticos ou, ao contrário, concentrar-se na linha melódica conduzida pela voz. Na mesa colada ao palco do Mistura Fina, o retrato fez-se nítido: da aparente oposição entre a energia irradiada pelo som e a delicadeza de sua presença, inconscientemente, sem artifícios ou grandes cuidados de produção, Céu forja naturalmente a mais interessante personalidade artística da música brasileira atual. Ave Céu!



Rodrigo Maranhão - Temporadas no CCC
Do Rodrigo Maranhão nervoso e de poucas palavras da estréia do show de lançamento de Bordado, ao bem humorado e falastrão da mais recente apresentação em novembro último, nota-se, além da mudança de comportamento, um compositor e uma banda cada vez mais a vontade com o repertório. Os arranjos permanecem os mesmos, privilegiando instrumentos acústicos, embora algumas músicas tenham incorporado baixo e guitarra, mas, agora, há margens para maiores improvisos. Especialmente, a partir do acordeão de Marcelo Caldi. A participação de convidados especiais, como Edu Krieger e Roberta Sá, renderam números memoráveis no palco do Centro Cultural Carioca. Se já estava afirmado como compositor, o carinho da platéia presente em seus shows indica que somente as canções não nos satisfazem. É na delicadeza de sua voz e de seu violão, na cumplicidade com seus velhos companheiros de Bangalafumenga, que Rodrigo Maranhão cria as mais belas interpretações que suas canções podem ter. Sendo um cara generoso, de vez em quando ele pode convidar uma ou outra intérprete para cantá-las em dueto. Com Roberta Sá, "Olho de Boi", inédita tanto nos shows dele quanto nos dela, ficou linda.



Na próxima parte, Thalma "Voz" de Freitas e Paulão 7 Cordas, Bebeto Castilho e Cibelle.

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