O Humaitá pra Peixe despediu-se do público ontem, no Oi Futuro, com o concorridíssimo show de Quito Ribeiro. Mesmo tímido como intérprete, pouco a vontade no palco, especialmente no começo da apresentação, Quito mostrou-se um excelente compositor. O baixo de Pedro Sá é o núcleo central de onde partem graves vibrações Sua música esgarça os limites do samba-reggae de sua Bahia natal. O samba é de roda, com seus acordes maiores e o ritmo marcado na palma da mão, originário da tradição popular que por muito tempo esteve soterrado sob a vulgaridade do axé, mas agora parece voltar à luz em frentes diversas. O reggae se apresenta em vertente dub, processado organicamente, sem remix, dj ou programações. O núcleo central é o baixo de Pedro Sá com sua gravidade densa. As duas baterias, a cargo de Marcello Calado e Stéphane San Juan, ora se dobram em eco, ora se quebram em desafio, completadas pela percussão de Leo Monteiro. Benjão, entre a guitarra e o violão, faz a base harmônica para a típica marcação rítmica e suja da guitarra de Gabriel Bubu e seus pedais de efeitos. Por outro lado, fica óbvio que a voz de Quito não está a altura da riqueza melódica de suas composições. Muitas vezes ele tem dificuldade para alcançar algumas notas mais altas, mas as boas vibrações que emanavam da platéia fizeram com que ele ficasse mais solto e, também, a festa mais bonita. Pelo visto o espaço Oi Futuro tornar-se-á um palco obrigatório nas próximas edições do festival.
Belo final para a vitaminada edição 2008, que além dos shows no palco principal, nos fins de semana, na sala Baden Powell, incluiu em sua programação atividades diversas: talk shows às segundas no Cinematèque Jam Club, debates às terças no Bar Mofo, workshops instrumentais e de produção musical às quartas e lançamentos de discos no Oi Futuro às quintas. Ou seja, pescaria ininterrupta ao longo de 28 dias, pela primeira vez desde a primeira edição, 14 anos atrás.
Como sempre acontece, os artistas escalados para o palco principal compuseram um painel desigual. Musicalmente, isso não é ruim. Diversos gêneros e estilos foram contemplados e essa é uma das características que faz do Humaitá pra Peixe um dos mais interessantes festivais independentes do país. O efeito colateral desta mistura é que alguns artistas acabam ficando deslocados, por uma razão ou outra, e o show não funciona. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o Z'África Brasil. Acompanhados por baixo, guitarra e bateria, além dos três MC's e o DJ, O único representante da cena hip-hop no festival fez um show competente, mas, talvez pela chuva que caiu na cidade, não encontrou seu público. No extremo oposto, há o caso de Roberta Sá. Cantora afirmada entre crítica e público desde o lançamento de seu primeiro cd, Roberta lotou a Baden Powell com os seus fãs, algo que não faz parte do propósito do festival. Não se tratam propriamente de equívocos da escalação de 2008, pelo contrário. No primeiro caso, foi válida a aposta em uma das melhores bandas de rap do Brasil, mas parece que no Rio não há correspondência à linguagem e aos elementos do rap paulista. E, o segundo, parece ter sido uma tentativa de ampliar o público do festival através de um nome de alta potência para além do circuito independente. Nem vamos falar daqueles que não justificaram, pela música, sua presença no festival. Vale o registro de que foram poucos, pelo menos aqueles aos quais assisti.
O ponto alto na Baden Powell deu-se logo na primeira semana. Apesar de ter feito apresentações no Teatro Odisséia e no Cinematèque, o Vanguart ainda não havia recebido a devida atenção do público carioca. Bruno Levinson e sua turma fizeram o que lhes era devido: jogar luz sobre o fenômeno. Se eles realmente vão emplacar por aqui só o futuro irá dizer. Entre muitos bons shows, apenas um, este ano, creio eu, deverá entrar para história do Humaitá: foi a estréia do Maquinado de Lucio Maia em palcos cariocas, devidamente registrada aqui.
Da segunda semana em diante, houve alguns momentos dignos de nota: Manacá e Frank Jorge juntos fizeram a melhor noite do festival (Leia e veja aqui). A banda carioca, prestes a lançar agora em março o seu primeiro disco oficial, pela EMI, com produção de Mario Caldato Jr, fez um belo show, embora tenha enfrentado uma platéia um tanto acomodada nas poltronas da Baden Powell. Por sua vez, Frank reacendeu paixões gaudérias nos gaúchos radicados no Rio, e até mesmo em alguns que vieram especialmente para ver o show, e contagiou seus fãs cariocas com seu energético baile-rock-sessentista.
Os também gaúchos da Superguidis com suas guitarras em fúria justificaram o hype virtual que os garantiu no festival. Coube a eles também o maior sucesso da cobertura conjunta da Tuba do Pindzim e O Dilúvio: em um dia, houve 1300 acessos à nossa reportagem especial. Veja aqui.
Em menor escala, o Songoro Cosongo apresentou sua inusitada e criativa sonoridade latino-carioca-americana para uma sala praticamente vazia. Presença constante nos palcos da Lapa, talvez a banda não tenha conseguido atrair seus fãs boemios a uma apresentação cujo início se deu ainda à luz do dia sob uma chuva que parou diversos pontos da cidade. Poderia ter sido muito mais animado, tal qual a música que se viu no palco. Outra banda de presença constante na noite carioca, o Fino Coletivo levou bastante gente à sua apresentação, porém, só conseguiram mesmo fazer a galera tirar a bunda da cadeira para dançar nos últimos números do show. Por fim, o show surpresa foi o que se esperava do encontro entre Canastra e Brasov: uma grande celebração com muito bom humor e descontração. Um final bem carioca, digamos, embora não tenha se configurado em surpresa alguma.
A melhor novidade do Humaitá pra Peixe 2008 foram os talk-shows. Às segundas, no Cinematèque, talvez tenham acontecido os melhores momentos do festival. O evento configurou-se em um sarau biográfico com roda de violão. Bruno Levinson conseguiu reunir artistas altamente relevantes na atual cena carioca, extraiu deles boas histórias e, o melhor, muitas músicas inéditas. Veja Rodrigo Maranhão e Pedro Luís interpretando "Rap do Real" e "Rosa que me encanta" clicando nos links. E após o carnaval o Blog do Pindzim vai produzir uma reportagem em texto e vídeo acerca do tals-show do +2.
Bem, aqui termina a cobertura conjunta da Tuba do Pindzim e do Dilúvio sobre o Festival Humaitá pra Peixe. Já com saudades da prolífica pescaria de verão nos despedimos desejando um carnaval com muita música boa.
Agô Pindzim!
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