terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Siba e Catatau juntos em eletricidade

Muita gente credita até hoje o fim do Mestre Ambrósio ao trabalho que Siba veio a desenvolver com músicos da Zona da Mata pernambucana a partir do disco A Fuloresta do Samba (2002). No ano anterior a banda lançara Terceiro Samba e parecia estar seguindo sua escalada ascendente de Pernambuco para o Brasil inteiro e daqui para o exterior. No Rio, o show de lançamento em um Canecão lotado, em que de toda geração do mangue beat até então apenas Chico Science e Nação Zumbi haviam tocado, foi apoteótico. Rodas de ciranda propagavam-se umas dentro das outras até tomarem o salão inteiro, muitos versos eram entoados pelo público com fervor e o bis estendeu-se para muito além do que a banda podia esperar ou estava preparada. Os maiores sucessos tiveram que ser repetidos até que o encerramento definitivo se deu com Siba improvisando versos ao microfone.

Quem tivesse prestado atenção àquele último número, talvez não viesse a se surpreender com o futuro trabalho do compositor, cujo cerne viria a ser a poesia rimada. Mas o Mestre Ambrósio era então uma banda amada com tamanha devoção pelos seus fãs, que eles não poderiam imaginar que o seu fim se desenhava em um horizonte não muito distante. No entanto, aquele improviso era também uma pista de que os caminhos a seguir poderiam tornar insustentáveis as latentes divergências internas entre os seus integrantes. O processo de gravação de Terceiro Samba fora conturbado - o clima no estúdio não era nada bom, como relembraria anos depois o produtor Beto Villares, e o próprio Siba admitiria. Nem todos compartilhavam as mesmas ambições artísticas e estéticas. Cada integrante tinha seus próprios planos.

DAS CORDAS ACÚSTICAS ÀS ELÉTRICAS
Este ano, quando Siba novamente desviou sua trajetória da trilha óbvia, não houve trauma semelhante. Pelo contrário, Violas de Bronze, gravado em parceria com o violeiro Roberto Corrêa, foi saudado como uma obra coerente com a sua carreira e com aquilo que dele se poderia esperar. "Eu conquistei uma coisa muito boa, que nem foi intencional no começo, mas que hoje eu comemoro. Quando eu fiz a ruptura do que eu fazia com o Mestre Ambrósio para o que eu fui fazer com a Fuloresta, que foi realmente uma ruptura grande em termos de procedimento, de resultado sonoro, e até do tipo de pessoas com que se trabalha e tal, eu fiz uma guinada muito radical que me possibilitou, a partir daí, que eu possa fazer quantas guinadas eu quiser desde que eu mantenha uma coerência que é muito subjetiva minha", diz Siba, explicando a repercussão que o trabalho com Roberto vem obtendo, em entrevista via Skype ao Blog do Pindzim. "Tem um ponto que é constante no meu trabalho, alguns procedimentos que são meus e que têm me guiado, mas depois que eu fiz o Mestre Ambrósio e fiz a Fuloresta, que são tão diferentes, eu acho que fazer um disco com Roberto, só de rabeca e violas, deixou de ser pra mim uma guinada tão radical", completa.

Roberto Corrêa e Siba (Foto: Pablo Francischelli)


E se trata de um disco nada convencional. Com arranjos fundamentados apenas em viola caipira e de cocho - a cargo de Roberto -, e viola nordestina e rabeca - pelas mãos de Siba -, trata-se de um disco "estranho", na definição do próprio, por unir dois músicos cujas personalidades e trabalhos autorais são tão distantes e distintos quanto suas origens - Roberto vem do Brasil Central e Siba,  como se sabe, do Nordeste. "Eu não sinto mais tanto o peso de ter que ser coerente com um estilo musical que o público venha a me cobrar. As pessoas me cobraram o Mestre Ambrósio por uns anos e depois se acostumaram com isso e hoje eles sabem que o que dá o norte do meu trabalho não é um formato em si, é uma outra coisa", afirma, encerrando o assunto.

Este desvio eventual fez com que Siba se reaproximasse dos instrumentos de corda, praticamente abandonados desde os tempos de Mestre Ambrósio - embora na intimidade ele sempre os tenha mantido ao alcance da mão. E foi assim que a eventual imersão no universo da viola, por vias tortas, acabou sendo definitiva para abrir uma nova vereda em sua carreira. "Eu voltei a tocar guitarra agora, junto com esse processo do Violas de Bronze", revela Siba, para em seguida enfatizar: "guitarra elétrica".

A própria viola não será abandonada nesta nova fase que se anuncia, mas ganhará captadores e, quem sabe, distorção. Siba encomendou a um luthier de São Paulo uma viola elétrica que já está em suas mãos e com a qual ele vem preparando material para um futuro disco. "Meu próximo trabalho vai vir muito mais ligado às cordas, especialmente à viola e à guitarra. Uma coisa bem mais elétrica mesmo, retomando um pouco do que foi o lado elétrico do Mestre Ambrósio, só que talvez de uma maneira diferente", conta Siba, para logo depois vaticinar: "acho que vai ser diferente de tudo o que eu fiz antes, mas isso está se processando para mim agora, nesse momento". Momento este que não deixa de ser uma surpresa para ele próprio. No auge de seu envolvimento com a Fuloresta, Siba chegou a achar que jamais voltaria à guitarra. "Mas cada tempo é um tempo", pondera.

Siba e a viola nordestina (Foto: Pablo Francischelli)


PARCERIA COM CATATAU
Outra influência que seguramente o conduziu a esta nova trilha foi a de Fernando Catatau, líder do Cidadão Instigado. Siba revela que tem sido um ouvinte atento de tudo o que o músico e compositor cearense tem feito de um bom tempo para cá. Ao lado da Nação Zumbi, é a principal referência musical de Siba no cenário da música brasileira atual. Há um mês atrás quando conversamos, Siba ainda tinha poucas certezas acerca do novo trabalho, mas a participação de Catatau era uma delas. "Eu ainda estou montando esse trabalho novo. É um trio ou quarteto totalmente elétrico, de bateria, baixo e guitarra e viola elétrica, rabeca também, tudo muito elétrico. Praticamente é um power trio ou um power quarteto, não sei bem ainda, e quem vai produzir esse trabalho junto comigo é o Catatau. Ele é o grande parceiro dessa história", afirmou.

Além da coprodução do futuro trabalho, Catatau poderá integrar a banda idealizada por Siba. "É possível que sim, que seja eu e ele tocando as cordas. Isso é para o ano que vem. Já comecei agora, já tenho trabalhado material, tenho me preparado, e no começo do ano que vem a gente começa pra valer mesmo", diz. A ideia é levar o projeto ao palco no primeiro semestre, com apresentações em lugares pequenos, para depois entrar em estúdio. Siba prevê o lançamento em disco no final de 2010.

FULORESTA E NAÇÃO JUNTAS
Nem por isso, Siba e a Fuloresta entrarão em recesso. E até mesmo no trabalho com o grupo a eletricidade deverá se fazer sentir. Além das apresentações que vem fazendo desde o lançamento de Toda Vez que Eu Dou Um Passo o Mundo Sai do Lugar (2007), a Fuloresta pode se unir à Nação Zumbi para shows conjuntos, como aconteceu em duas oportunidades neste ano - no carnaval de Recife e no Vale do Anhangabaú, em São Paulo, por ocasião das festividades do Ano França-Brasil. "São as duas bandas no palco com o repertório em comum dividido. Então a Nação toca nas músicas minhas com a Fuloresta e a Fuloresta toca nas músicas da Nação também, é tudo bem misturado. Agora, é uma banda muito grande, imagine, então é um projeto pra se fazer de vez em quando, ele é um pouco inviável", explica Siba.



O FIM DO MESTRE AMBRÓSIO
Dada a imprevisibilidade dos rumos de sua carreira, há alguma esperança de que os fãs do Mestre Ambrósio vejam a banda novamente reunida?, muitos podem se perguntar. Siba acredita que não, mas não usa a palavra "impossível" para descartar totalmente uma futura reunião. Diz que acha "bem difícil". Por outro lado diz que composições antigas do Mestre Ambrósio de sua autoria podem reaparecer em algum momento no seu repertório, embora atualmente não haja nenhuma em vista. Por fim, aproveita para esclarecer de uma vez por todas que o fim da banda aconteceu independentemente de sua vontade.

"Apesar de eu ser creditado como o primeiro que saiu da banda pra fazer a Fuloresta, eu fui um dos poucos que não saí da banda, na verdade. A Fuloresta foi um projeto para o qual eu me preparei por anos, inclusive preparei a banda pra ele. A gente tinha uma proposta em comum de parar por seis meses para isso e para todo mundo também fazer as suas próprias coisas. Sendo que eu acho que o nível de conflito de interesse já tava bem alto em termos de interesse profissional e de carreira, de modo de ver o desenvolvimento da coisa. Com essa parada foram saindo um, dois, três. Na hora que saiu o terceiro a parada ficou por tempo indefinido. Nesse tempo indefinido eu acho que já se passou tempo demais e praticamente hoje eu acho muito difícil voltar a banda. Não existe um fim decretado, mas ao mesmo tempo eu acho muito pouco provável uma volta. Se na época que a banda tinha 12 anos de batalha e tinha, digamos assim, uma inércia positiva que possibilitava que a gente parasse por um tempo para depois retomar, porque tinha um público e tinha toda uma imagem, uma presença e tal, não aconteceu, hoje, depois de tantos anos, é um tamanho de esforço dentro de um contexto que é muito diferente. Cada um está em uma cidade diferente fazendo suas coisas,  então eu acho que o que a gente tinha pra dizer tinha que ter continuado naquela época", encerra.



Na verdade, o Mestre Ambrósio segue vivo na trajetória peculiar que Siba vem traçando ao longo de seus quase 20 anos de carreira. A proposta híbrida de combinar elementos regionais e universais já estava presente no trabalho da banda e veio - e vem - se expandindo cada vez mais em sua caminhada. Siba é um nome que nunca vem sozinho, está sempre junto de outros artistas importantes, de personalidade própria. Pode estar em parcerias com a paulistana Céu ("Nascente") ou com os conterrâneos Lucio Maia e Dengue ("Alados"), em projetos coletivos de sabor regional, como a própria Fuloresta, e de matizes latinas, como em América Contemporânea. Ou simplesmente indefiníveis, como a dupla com Roberto Corrêa e a futura banda com Catatau. Toda vez que ele dá um passo o mundo sai do lugar - e a música se expande para além do reconhecido e do imediatamente reconhecível, constituindo uma das obras mais sólidas, belas e relevantes de toda uma excepcional geração.

Agradecimento a Socorro Macedo e Le Fil Comunicacao Digital.

3 comentários:

Anônimo disse...

Eu acho o Terceiro Samba o melhor dos Ambrosios, tem sambas do quilate de um Nelson Cavaquinho ou de um Cartola.
Nascente(com Céu) e Alados(Maquinado) são realmente muito boas, já o Fuloresta eu gosto de algumas coisas.
Essa banda com o Catatau promete, hein?
O cara está em todas!

PS: Esse show com a Nação no carnaval foi foda!
Há 10 dias eles também tocaram duas musicas em um show da Nação(Nascedouro e Trincheira) para o futuro DVD dos caras.

Ahhhh, espero seu artigo sobre o porquê do ano de 2009 ser tão especial pra música.

Um abraço
José Henrique

PINDZIM disse...

Pode esperar que o texto sobre a safra 2009 ainda vem. Agora, durante as férias, aproveitarei pra rascunhá-lo.. Em janeiro estou de volta.

abraço

Anônimo disse...

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