Pode parecer exagero duas postagens subseqüentes sobre um mesmo artista, mas não quando se trata de um compositor da estatura de Rodrigo Maranhão. Após uma estréia embargada pela emoção de estar levando ao palco pela primeira vez o show do lançamento de Bordado, seu primeiro disco solo, ele voltou ao palco do Centro Cultural Carioca mais a vontade na quarta-feira, dia 23. No final, a apresentação foi coroada pela entrega do Grammy de Melhor Canção Latina que lhe é de direito, oficialmente recebido por Maria Rita, por “Caminho das Águas”. Uma das primeiras cantoras a reconhecer o talento do compositor, ao gravar “Baile da Pesada”, Fernanda Abreu foi quem entregou a Rodrigo Maranhão o gramofone dourado sob louvação do público, interrompida apenas pelo segundo bis da noite. Antes de cantar seu maior sucesso, divertiu-se revelando se tratar de um prêmio tardio aquele, uma vez que a canção foi composta quando ele tinha 18 anos, inspirada por cânticos de roda de capoeira, no caminho entre a sua casa e a praia. Na dúvida entre gravá-la ou desfrutar dos prazeres imediatos do sol e do mar, optou, ainda que inconscientemente, pela futura consagração.
Acompanhado por seus companheiros de Bangalafumenga – Tiago Di Sábato na guitarra, Dudu Fuentes e André Moreno na percussão -, mais Marcelo Caldi no acordeão, Rodrigo Maranhão amplia no show o repertório do disco. Partindo de “Baião Digital”, música que originalmente daria nome ao disco e batiza o show, eles tocam todas as músicas de Bordado, exceto “Olho de Boi”. Um set solitário contempla os sambas “Pra Tocar no Rádio” e “Recado”, ao vivo acrescida de violão. Em seguida, ele recebe Edu Krieger para juntos, sob o choro da sanfona, cantarem “A Mais Bonita de Copacabana”, presente em Samba Novo, projeto coletivo produzido por Maranhão. Já com a banda de volta ao palco, levam “Ciranda do Mundo”, música do convidado que, como o próprio contou orgulhoso, não é mais atribuída a ele. Tornou-se de domínio público.
Canções que não entraram em Bordado reafirmam a unidade de uma obra ancorada na beleza das diversas tradições regionais da música brasileira e fazem crescer a expectativa de que as nossas intérpretes continuem recorrendo ao baú do compositor para trazer à luz mais alguns destes tesouros guardados. Entre os destaques, “Samba de Um Minuto”, com sua viola delicada tal qual a de Paulinho, que ontem contou com a participação especial de Zé Renato e faz parte do repertório de shows de Roberta Sá, e uma canção espiritual, com menções divinas, a qual me falta o nome, que guarda parentesco com a fase mística de Gilberto Gil.
Assistindo à interpretação do autor ali no palco, fiel ao disco na simplicidade dos arranjos acústicos construídos a partir do violão, ou seja, da essência das canções, tem-se a certeza de que se está diante não só de um magistral compositor, mas de um dos grandes artistas da música brasileira atual. Já se dizia de Caymmi que ele é imbatível na interpretação de suas próprias canções. Seja ao vivo ou em estúdio, o mesmo pode ser dito de Rodrigo Maranhão.
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